Tuesday, August 29, 2006

Words

As palavras são essenciais.
Palavras escritas, faladas, sussurradas, cantadas…palavras essenciais para a comunicação. Sim, mas tão perigosas que são as palavras. Têm o poder de esclarecer ou iludir, apoiar ou menosprezar, amar ou magoar. Platão deu três sentidos às palavras: remédio, veneno e cosmético, quão perigosos estes sentidos das palavras, quando usadas incorrectamente.

O veneno das palavras, é para mim desconcertante. A forma velada como actua este veneno, onde muitas das vezes, somos nós que o bebemos de livre vontade. Um veneno que seduz e nos faz estar fascinados no que ouvimos, fazemos e sentimos. Acreditar no que não existe.
Assim, parece que, já não irei mais em palavras. A veia sensorial que conecta o canal auditivo com o processamento emocional cerebral está estrangulada. Aconteceu, quando desapareceu a raiva.

Todas as pessoas têm as suas conjunturas pessoais, contradições, dúvidas, ilusões, inaptidões emocionais, falsas certezas e modos vivendo. Como saber se as palavras que proferem são as sinceras ou se ocultam verdades?
Palavras, têm-las qualquer um.

Thursday, August 24, 2006

Stay at bay

Para renascer há que morrer.
Para reestruturar o ser, há que partir novamente do nada e alinhar tudo aquilo que não podemos negar que somos com o como somos.
A vida de uma pessoa depende desse alinhamento, dessa alquimia interior, onde centramo-nos em nós e partimos para as coisas, para os outros. Tudo parte de nós, a forma como interagimos com o mundo exterior, as relações inter-pessoais que temos e como as temos. Daí a importância da coerência interior.

Tudo não deixa de ser feito com alguma tristeza e revolta.
Demasiadas equações foram desalinhadas e dói não ter defesas para as réstias, seja lá o que for, que ainda sentimos. Na desilusão de tantas verdades, revolta que após toda a destruição, ainda haja um fogo latente. Um fogo que perdoa, que consente, que arde. O mesmo fogo, que deveria de ter sido a primeira coisa a ser destruída, extinta, devastado em decepção como tudo o resto.

As verdades ou aquilo em que acreditamos é o que nos sustenta. Mas as verdades são algo engraçado. Há aquilo em que acreditamos e que é verdade, que é provado, testado, experimentado, vivido e há aquilo em que escolhemos acreditar. Mesmo não sabendo se realmente é verdade ou não, aceitamo-las. Trata-se de sobrevivência, por muito ignorantes que possamos ser sobre a vida e o nosso papel nela, apercebemo-nos da extensa e contínua multiplicidade e mutabilidade de coisas que se transformam umas nas outras, que se tornam opostas a si mesmas e que às vezes desaparecem como fumo. Tudo sem o nosso controle e o máximo que – por vezes – podemos -tentar- controlar é o nosso ser nessa tal vida e como nos comportamos nesses ciclos de mudança. As nossas verdades e a nossa congruência para com elas, são a base que precisamos. Porque tudo parte de nós.

Não sou a mesma Druiel de sempre. Não poderia mesmo que o desejasse, não podemos passar por esta vida, por relações intensas sem sermos afectadas pelas consequências da nossa vivência. Existiam as minhas verdades:
- As pessoas são fundamentalmente boas;
- O bem vence sempre o mal;
- Só dando é que se recebe;
- Que devemos aceitar as coisas más na vida como aceitamos as boas;
- O amor verdadeiro nunca acaba.
Destas verdades desenvolviam-se equações indicando procedimentos de acção. Estas eram as bases e o golpe foi fundo.

Após a hemorragia conseguimos começar a ver o que restou.
Tudo bem, ainda acredito que as pessoas são fundamentalmente boas. Mas também sei o quão humanas são, e o ser humano… é imperfeito, falível, decepcionante e, por vezes, lamentavelmente previsível.
O resto da equação é descobrir o que temos a fazer para defendermo-nos dos enredos e dramas, incongruências e inconsistências pessoais de com quem nos relacionamos.

Da Druiel que está em renascimento, a melhor defesa é … Stay at bay

Sunday, August 20, 2006

Obituary



Druiel Ibsen Amado
07 Fev. 1972 – 19 Ago 2006-08-21


Sonhadora romântica, fotógrafa de raro talento e impetuosidade, responsável pela inovação da relação entre a fotografia e o mundo da música.


Ela era uma notável boémia, com um entusiasmo pela vida e vivi-a de uma forma única, original e que contagiava os demais. Pelo mundo inteiro por onde trabalhou, deixou uma legião de amigos e de admiradores. Lésbica assumida, nunca deixou de reclamar o direito à igualdade e tornou-se numa das caras mais conhecidas do secreto Lobby Gay.

Druiel Ibsen Amado nasceu em 1971 em St.Ives, Cornualha, Inglaterra. A sua mãe era de origem Inglesa, de St. Ives, uma pequena vila piscatória no sudoeste, viria a ser a maior influência na sua vida. O seu pai era português, de St. André. Filho de um armador, que um dia enviou o filho para a Cambridge University, a mesma onde viria a conhecer a mãe de Druiel. Os dois viveram felizes e extremamente apaixonados até ao último dia. A família toda, que incluía Druiel e mais 3 irmãs, começaram por viver em St.Ives, depois Londres até que Druiel, duas das suas irmãs (Margot e Mariana) e os pais vieram morar para Portugal. Os pais viriam a falecer num incêndio, quando a casa na quinta do Meco ardeu devido às velas que os pais tinham acendido no jardim.

Druiel tinha 32 anos, vivia em Londres – já há 14 anos – onde a sua carreira tinha acabado de atingir a fama. Ela frequentou a Art and Image University of London e o Camberwell College of arts, mas sem grandes ambições académicas. Com uma grande tenacidade e habilidade, ela foi conquistando o seu lugar de direito no jornalismo fotográfico. Em vez de lutar – como faziam os outros aspirantes – junto das maiores revistas e jornais da capital inglesa, ela começou por trabalhar em jornais locais nos subúrbios de Londres para ganhar prática e conhecimento sobre os bastidores dos concertos.

Porém os tempos nem sempre foram auspiciosos, após algumas retiradas furtivas para Portugal onde tentou desenvolver outro aspecto da sua fotografia o Nu feminino, em 1998 Druiel volta para Londres e com renovada energia volta a apostar numa carreira como fotógrafa. Após ter travado conhecimentos com alguns artistas que viviam nos subúrbios dos jornais para os quais trabalhava – pedindo entrevistas e sessões fotográficas para o jornal – conseguiu conquistar a admiração de uns poucos artistas que tinha fotografado. Boy George, Mick Jagger, os irmãos Gallagher e a Mel C foram apenas alguns dos seduzidos.

Ao mesmo tempo que Druiel emergia no reconhecimento público do seu talento fotográfico, o público cada vez mais compreendia o porquê do sucesso de Druiel, o magnetismo que tinha nas pessoas, na forma como lidava com elas. Lamentavelmente, ela nunca viria a conseguir aplicar esse mesmo magnetismo à sua vida pessoal. Ao contrário da história de contos de fadas dos seus pais, Druiel não realizou o outro sonho da sua vida que foi viver o amor tal como sonhava. Após vários desaires amorosos, nos últimos anos de vida não se lhe conhece nenhum relacionamento.

Druiel deixa publicados três livros: “the eye of the beholder”, 2001; “V & Clict”, 2002 e “I dare”, 2004 sendo este ultimo utilizado hoje nas aulas de fotografia do Camberwell arts College. Para alem destas publicações, Druiel deixa um portfolio de uma grandeza irrefutável nos arquivos de revistas como Rolling Stone, Melody Maker, NME, Vogue, Vanity Fair e entre outras Life.

Extremamente humanista e filantrópica usou os lucros do seu livro “V & Clict” para erguer a Fundação Rainbow Chassers, uma fundação para ajudar mulheres lésbicas nas suas necessidades, sejam elas quais forem, desde apoio psicológico a apoio financeiro em casos de descriminação.

Tal como em tudo na sua vida, o fim foi repentino e inesperado. Ela ia buscar material para uma sessão fotográfica em Sintra, quando o seu Nissan Navarra despistou-se na estrada sinuosa. Druiel foi encontrada sem vida ao volante do veículo, apesar do violento acidente, o mp3 da pick up continuava a tocar, ironicamente a musica era This war is Over de Melissa Etheridge.

As suas 3 irmãs Margot de 52, Vivianne de 44 e Mariana de 39 sobrevivem-lhe, bem como os seus 4 sobrinhos e 3 sobrinhas.


To be continued...

Friday, August 18, 2006

Evolution

18 Aug

Equilíbrio.
Entre inúmeras prioridades alguma ordem tem que ser introduzida no caos. Alguma ordem às prioridades, até porque – falando apenas de certas prioridades - do sucesso de uma depende a realização de outra. Entre várias opções a mais lógica é a prioridade do equilíbrio.

Com mais intensidade ou com menos densidade, momentos de desgosto não me são desconhecidos. De cada vez que os recordo e o que levou até eles, recordo-os de uma forma diferente, em certos aspectos sob uma nova luz que traz respostas às questões ou situações do presente. Às vezes não trazem nada e apercebemo-nos do padrão, dos erros que se comentem.
No final fica sempre uma pequena réstia do sentir de Fénix, cinzas que nos vão reconstruindo.

Noite após dia, vamos encontrando o nosso equilíbrio. A vida existe e continua sem complacências com qualquer sofrimento, ou seja, eu vivia antes de tudo isto e vou continuar a viver. O processo de evolução está em voltar ao equilíbrio que existia antes de todo o remoinho emocional.
Um efeito extraordinário que tem o descalabro total é o potencial da renovação. No mínimo isso é desafiante. Não se trata só de voltar a equilibrar o nosso ser, mas como também encontrar as formas mais adequadas a esse equilíbrio. Formas diferentes das anteriores, versões melhoradas.

Há uma certa força que vêm proporcional ao aumento do equilíbrio. Quanto mais constante é o equilíbrio, mais constante é a força que nos faz seguir em frente. Ao nosso ritmo. Aceitamos que as coisas têm um fim, mesmo aquilo que nunca prevíamos ou pelo menos, não no tempo em que às vezes acontecem. Aceitamos recomeçar a viver e nesse momento … a sombra do Coming back.
Quando a dor já deixou de ser aguda, quando já deixou de ser latente à mercê de um rastilho qualquer, quando as perguntas sem resposta já estão riscadas, quando a razão já trouxe alguma supremacia ao coração, quando o amor ainda tenta lutar pela sua existência… Aí, nesse preciso momento aparece aquela sombra que nos puxa para o que em amor, em paixão, tão inutilmente - por vezes - esperamos … um voltar.

Momento ínfimo.
Não há voltar.
Trata-se de uma reflexão agradável, voltar a tentar, afinal de contas ambas já aprendemos algo, talvez pudéssemos de facto ser felizes juntas. Mas não. Não podíamos. Bem disse que era ínfimo.
Não é por despeito, por vingança, por nada assim. Não é por falta de amor, de coragem ou paixão … é uma questão de sobrevivência.

E a sobrevivência depende da evolução.

Thursday, August 17, 2006

Metamorphosis




Rendemo-nos ao facto de que a vida é um processo. Não é um chegar a algum lugar, porque na realidade nunca chegamos. E já agora, rendemo-nos à realidade de que não podemos controlar o nosso futuro. Em contrapartida, podemos sim, preparar-nos para ele.



Não acredito que se encontre a felicidade plena ao lado de outra pessoa. Coisas como Alma gémea, a pessoa certa e o verdadeiro amor, são contos de fadas que não me seduzem. Se estas verdades algumas vez existiram, nos dias de hoje, as coisas acontecem, apenas, a alguns iluminados.
Existem pessoas que deixam de fumar porque tiveram um ataque de coração, outras deixam de conduzir a 160kms hora porque tiveram um acidente de carro, outras deixam de se envolver emocionalmente porque tiveram um choque.

Quer se fale de catarse, purgar, metamorfose, renascimento, no fundo vai dar tudo ao sentido práctico da nossa realidade, de que a vida continua e este foi e é um processo de crescimento. E tudo acontece em fases, em ciclos, em passos sequenciais … a catarse para a expiação da tristeza, o purgar para a purificação do coração, a metamorfose para a transformação do ser e o renascimento para que possamos … reviver.

Tal como o nevoeiro da manhã, lentamente deixamos ir aqueles pensamentos, aquelas músicas, aqueles lugares, as esperanças e até mesmo as emoções. Detesto redundâncias, mas é inquestionável: dia a dia o ser regenera-se. Dia a dia.

Andrea é sem sombras de dúvidas a minha melhor amiga, bom é como se fosse mais uma irmã, mas sem aquele lado maternal que por vezes as irmãs têm. Conhecemo-nos desde crianças, até aos seus 28 anos sempre viveu em St. Ives, na Cornualha Inglesa – terra da minha mãe – mas depois veio para Portugal para abrir um bar na praia da Adraga, perto de Sintra. Faz tempo que andava a adiar ir ter com a Andrea. Não por causa dela, mas porque em seu redor há sempre muita agitação ou é no bar com os clientes ou em casa com os amigos. Mas esta semana ví que não poderia adiar mais e ainda bem.

Fui ter com a Andrea ao final da noite, quando a animação já tinha esmorecido, quando a maior parte das pessoas já comeu, dançou e bebeu aquilo que queria e amanhã é outro dia de praia! Mas para mim e para a Andrea as coisas ainda nem se quer tinham começado. Passava pouco das duas da manhã, depois do último cliente, da última cadeira por arrumar, deixamos apenas o essencial do bar e esplanada aberta, eu escolhi a música e preparei as bebidas, a Andrea fez algo para comer e começou a nossa private festa. Passamos a noite a falar, rir, chorar, ouvir o mar, a comer, a ver a noite, a beber, a ouvir músicas novas e velhas, a falar e a tentar seguir em frente.

Já o sol estava a aparecer nas nossas costas quando no fim de um silêncio de apreciação, Andrea diz-me no seu Português inglesado:

- Allright, matey, crescer dói, mas tu cresceste.
- O que queres dizer que cresci. Vou aprender, vou crescer com isto, mas ainda não cresci.
- yeah you did. Tas diferente. Mais calma, mais ponderada.
- Andrea, miga, tou magoada é claro que estou mais calma. Estou sofrida. Entro nos lugares que tenho que entrar de óculos de sol porque não quero que me olhem nos olhos, ando no carro de janelas fechadas porque não me apetece deixar entrar o mundo exterior e andei duas semanas sem vir cá porque não me apetece estar em lugares muito movimentados. Aí tens. Claro que estou mais introvertida e receosa. Bolas, alguma vez quero passar por isto de novo?
- Não vais passar por isto de novo e tu sabes. Ao longo desta noite achei-te uma pessoa mais clara, mais confiante in what you are and you aren´t. Give yourself a break, às vezes exiges demasiado de ti. Vais te sair bem.


A melancolia de vez em quando ainda é presente, mas devo de estar na fase da metamorfose porque depois da conversa com a Andrea, reparo que existem aspectos do meu ser a transformarem-se. Provavelmente a minha aversão ao mundo exterior está directamente relacionado com o efeito casulo que qualquer metamorfose sugere. Porque é real há coisas a mudarem. Sentimentos, crenças, formas de agir e eu sinto-as.
Algumas coisas mudaram como se tivessem sido tiradas a ferros e tivemos que as substituir com outras razões, lógicas e emoções. Depois há aquelas mudanças que acontecem de uma forma lenta e profunda, que se movem no campo do que está e sempre esteve enraizado em nós e são essas que nos transformam o ser.



Imagem de Helena Vasconcelos
Obrigada

Monday, August 14, 2006

Surrender

Ainda são frequentes aqueles momentos em que sinto um soco no estômago.
Luto comigo mesma, contra emoções, contra retroceder em todo este processo, contra a revolta que me consome. No entanto, por vezes, é inevitável.
Claro que há romantismo no sofrimento. Prolongamos através da nossa dor um contacto, um outro tipo de relação. Ultrapassar essa dor é também libertar a pessoa.
Entende-se agora porque luto, porque combato a tristeza e as coisas que me prendem emocionalmente a algo, sem futuro, e onde o presente só existe por causa da dor que ainda sinto. Mas quando essa terminar, encerrar-se-á um fascículo na minha vida.

Não gosto de fazer elogias à tristeza. Até porque hoje sei que até a tristeza é passageira. Nenhum abismo é sempre negro. Mas por vezes, existem as tais coisas que agitam o nosso lado frágil e temporariamente perde-se novamente o controle. A voz volta a fraquejar, de novo o isolamento e o vazio.

Não interessa quanto tempo passou.
Está tudo ainda tão vivido e ao mesmo tempo tão distante. Os espaços, as noites, os dias, as palavras, os detalhes, as músicas, as conversas … e a amizade de que sinto falta.
Depois vêm as perguntas – novamente – para as quais, algumas, já temos respostas e para outras já não interessam as respostas. Depois vêm o soluçar, o vazio, a revolta e por fim a resignação.

Perdi-a, perdeu-se, perdi-me, perdemo-nos, não interessa. Acabou. Não há volta e não há razão que explique como perdi a única pessoa com quem eu verdadeiramente acreditava ser possível. È óbvio – agora – que não viria a ser possível e tudo passa a ilusão. Mas como?

O que dói e porque dói é o que mais questiono nestas alturas. Encontrar a fonte para a secar. Dói o quê concretamente, esta deprimente angustia perante o que foi que correu mal? Porquê? Por causa das dúvidas, dos “E se” que me picam de vez em quando ou por causa da falta de coragem para esquecer o que ainda está tão vivo na minha pele no meu sangue no meu adormecer em tudo o que me rodeia.
Tola. Abri todo o meu espaço e ficaram memórias demais. Revolta-me a minha atitude. Mas não o suficiente para deixar de estar apaixonada.

Problema é justamente esse.
Ainda estou apaixonada.

Friday, August 11, 2006

Playlist

A quem é que nos queremos enganar?
Sofremos, esperneia-mos perante o amor, no entanto na altura em que mais uma vez estamos perante uma nova faísca, os nossos passos vão seguir essa renovada emoção.
Podemos admitir que somos egoístas demais para ter um relacionamento, podemos querer ficar na zona de conforto emocional, podemos tentar, mas haveremos sempre por falhar.

Ontem há noite fui sair com o Rafa – o meu sobrinho –, nada demais apenas um copo para descontrair. Falar sobre nada ou sobre tudo o que eu quisesse. O Rafa é daquelas pessoas que não precisa de muito para falar ou interagir, e deixei-o falar. A dada altura estou a falar também e a gesticular como ele … e claro, a rir. È praticamente impossível não rirmos das suas histórias e dos seus desaires amorosos. Sobretudo por causa da forma descontraída e um pouco efeminada com que conta as coisas.

O Rafa – Rafael – e eu temos uma relação especial, ele é o filho mais novo da minha irmã mais velha, Margot. Tem 25 anos, e desde os 17 anos que sabe que é Gay. Sem revoltas. Sempre tivemos um carinho muito grande um pelo outro, porem, foi só quando ambos admitimos as nossas homossexualidades que a relação viria a ter novos contornos.
Actualmente já nos conhecemos. Já passaram muitos anos de desabafos e alegrias, sabemos pelo menos como reagir às paranóias ou como lidar com o outro em situações de stress.

Depois de umas boas risadas veio o silêncio e falamos sobre o que faltava falar. Não que houvesse muito que pudesse falar:

– O pior já passou. Custou um pouco, mas passou. No meio de toda a angustia, isso era a única coisa que eu sabia…Que todo o sofrimento, toda a tristeza, iria passar. Um dia. Digamos que está a passar. O que é óptimo. – Acabo por desabafar e o Rafa continua:
- Foi um grande tombo…
- Foi mais do que isso Rafa. Tombos levei eu no passado. Desta vez foi algo brutal choque, surpresa, tipo mosquito no para brisas de um carro. Estamos sempre a iludir-nos. Ou melhor, eu estou sempre a iludir-me! Tudo bem não é esta a pessoa. Mas deixei de ver certas coisas da forma como via antigamente.
- Receio pela próxima pessoa que se aproximar de ti.
- huh??
- A próxima pessoa que quiser aproximar-se de ti emocionalmente vai encontrar uma selva de cardos para desbastar!
- Eheheh, Pois! Achas? Nada disso. Sou eu própria que tenho que desbastar os cardos. Mas concordo contigo, a próxima pessoa vai ter um trabalho difícil.


Seja como for, até que uma próxima pessoa se vislumbre, ainda há o tal crescimento para fazer. Para acontecer. Até lá, ainda há muito para organizar, para limpar, reciclar.

Houve uma altura que reciclei pedras de calçada, outra a cor dos candeeiros de rua, os amigos, os lugares e os perfumes. Agora são músicas. Dezenas e dezenas de melodias que ainda me fazem fraquejar e perder a vontade de falar. Músicas que já vinham de outros tempos, que foram re-inventadas e agora pertencem a um novo passado. Dezenas de músicas que não eram só minhas, que tinham um olhar, um momento, um desejo.

Um determinado perfume pode lançar-nos num remoinho de imagens, de cheiros e recordações. Uma determinada música tem o mesmo efeito em mim. O feitiço tem que ser quebrado suavemente. Ouvir uma música aqui, outra ali e tentar superar as recordações, arruma-las calmamente numa gaveta qualquer. Elaborar uma nova playlist tipo *purge*, feita de músicas seguras, melodias que estão de acordo com o novo estado de espírito. Músicas que de alguma forma trazem tranquilidade à sede de respostas, que nos embalam na sua tristeza mais melancólica do que a nossa, que nos ajudam a libertar a revolta e a fechar a porta desta dor, deste amor.

Thursday, August 10, 2006

Waking up


Dizem que com a dor vem crescimento. Por muito inteligente, perspicaz e atento que seja o ser humano, só aprendemos através dos erros, do sofrimento, da adversidade.
Numa altura em que o sofrimento é mais acutilante, é um pouco difícil ver o que se cresceu. Mas as coisas também não são assim. Não acontecem de um momento para o outro.

Se há algo que eu já tivesse aprendido é o facto de por muito sufocante que seja, a dor, também passa. Aqueles acordares cheios de revolta, sobressaltados como se tivéssemos levado um murro no estômago, também esses passam. Após um choque emocional é difícil tentar manter-nos lúcidos. Entreguei-me ao choro enquanto achei que fazia sentido. Mas sabia que isto também haveria de passar. E passou.

Ontem o acordar foi sereno. Diria antes que não foi um acordar sobressaltado, com raiva ou tristeza absoluta. Foi um acordar. Já tinha os dois pés no chão quando reparei: Humm, até que o acordar não foi mau. Isto é bom sinal. Vamos ver se amanhã também é assim.
E foi.
Não resmunguei com as almofadas, com o despertador, o lençol, a gata e o resto das almofadas. Não acordei para uma tristeza, para uma solidão e um silêncio ensurdecedor.
Apenas me levantei.

Posso não saber muitas coisas sobre mim, neste momento. Mas sei o que sou e as coisas que me são inatas e as que não são. Talvez não saiba o que realmente quero e aquilo que me faz verdadeiramente feliz. Talvez tenha que apreender a ser um pouco menos. Talvez tenha que reestruturar toda essa coisas chamada amor e o meu comportamento nessa loucura. Mas por muito atordoada que esteja, sei que não sou uma pessoa depressiva, pessimista, inadaptada… Tenho os meus problemas em certos aspectos destas áreas, posso sentir-me tentada e à vontade numa vivência mais sombria… mas não sou eu por muito tempo. Não é essa a minha natureza. Talvez, aqui, seja uma lutadora.

O tempo de luto acabou. Rendi-me aos convites das minhas irmãs, dos amigos e vejo como o meu choque e dor pareceu ao mundo exterior. O meu silêncio, o isolamento, o sofá e os batidos de leite. Somos só nós que podemos parir a dor e cada um faz o melhor que pode fazer. Com o pouco que sabe.

Claro que vou crescer. Claro que vou aprender algo. Um sofrimento destes tem muito para certificar. Descobrir concretamente o quê é o próximo passo.
Imagem - Tela (outra) de Helena Vasconcelos.
Obrigada

Wednesday, August 09, 2006

Gym

As pessoas vão para o ginásio pelos mais diversos motivos. Perder peso, ganhar musculo, fazer exercício, conhecer pessoas novas, libertar o stress e a lista é infindável.

Da última vez que me inscrevi numa classe, foi de Aikido, uma arte marcial. Só fui uma vez. Antes disso tentei duas vezes a piscina. Depois de já ter experimentado durante 6 meses Hapkido – outra arte marcial - e 15 meses o ginásio state of the art Venus7. Pensando bem, este último não pode servir como exemplo para a minha falta de assiduidade em ginásios e classes de exercício físico.

Mas voltei a ingressar num ginásio.
Porquê?

Está comprovado que o corpo humano não consegue lidar com mais do que uma dor em simultâneo. Ou seja, caso tenhamos partido em simultâneo uma perna e um braço, o nosso cérebro só vai lidar em termos de dor com o ferimento mais agudo. Não os dois.

Não é que vá partir uma perna e um braço no ginásio. Mas o ginásio sempre o ví como um local sem estímulo. Não desta vez. A ideia era levar-me aos meus limites físicos, tirar-me as forças para sofrer e talvez conseguisse ver as coisas de uma outra perspectiva.

Já lá vão umas quantas horas de ginásio. Sem faltas o que é muito importante. Nunca se sabe quando – normalmente, de um momento para o outro – vou decidir fazer outra coisa qualquer. Canoagem, sei lá. Ou aprender a tocar Saxofone.

Curiosamente estou agradavelmente surpreendida com os poderes do programa de Musculação e Cardio. Enquanto que nos pesos estou preocupada com o número de séries, para que lado inspiro ou expiro, em quantos é que já vamos, nas máquinas a coisa torna-se diferente. Por exemplo a Elitíca. Maquina adorável. Já temos tido grandes conversas e chegado a conclusões ainda maiores.

Para mim os ginásios pecam por falta de interesse - apenas o Vénus7 é excepção à regra -, nunca gostei muito daquela coisa de estar a transpirar numa bicicleta em frente a uma televisão ou enfiada entre quatro paredes, mesmo que duas delas sejam de vidro! Se é para andar de bicicleta, prefiro colocar a bicicleta no carro e ir para qualquer lado.
Confesso que dá muito trabalho.

A Raquel e a Mariana são viciadas no seu Gym e Spa. Eu não sei se o ginásio delas dava brindes por cada novo membro, se não deveriam, pelo quanto elas se esforçaram para recrutar-me. Eu achava aquilo giro, mas não o suficiente. Achava mais intimidante do que atraente. Para mostrarem-me o lado fantástico do Gym, decidiram ter um serão girls only. Fomos ao ginásio, jacuzzi, massagem, jantar e acabamos a noite entre copos de vinho branco num bar perto do ginásio a falar sobre os últimos fashion trends.

Tem o seu lado terapêutico. O ginásio, os pesos, as máquinas, a música techno, as dores nos músculos, o esforço na endurance, o calor na pele, o suor, concentração completa em bater o programa, o mais depressa, com a maior estabilidade.

Julgo ser nas vezes que estamos mais vulneráveis que somos menos arrogantes. E todos nós somos arrogantes. No emprego, em casa, na escola, no modo como lidamos com os outros e às vezes, até mesmo arrogantes no sofrimento.
No que me toca.
Um momento onde eu esteja a quebrar os meus limites físicos, com o fio dental transpirado, a pele vermelha e um olhar fixo no painel da Elitíca, é para mim um momento vulnerável!

Não sei se foi pelo esforço que estava a fazer, mas ontem - a correr contra o programa – reparei que o perdão não poderia ser só da minha parte. Eu também tinha que ser perdoada. Afinal eu não lutei, eu não corri atrás.
Talvez tenha deixado de ser arrogante no meu sofrimento. Não que alguma vez culpasse apenas uma parte, mas deixei-me de atormentar sobre o que poderia ou não ter feito. Isto alivia qualquer dor.
E perdoar e ser perdoada, alivia ainda mais.

Enquanto o ginásio tiver este auto-analise-critica-conhecimento-evolução efeito, vou continuar a ser fan. Mas confesso ter pouca paciência para toda aquela coisa e para a cena da toalha! Eu passei a usar duas toalhas e a ir antes da hora de almoço, quando está praticamente vazio! A ver se isto dura.

Sunday, August 06, 2006

Prologue

Há momentos significativos na vida de uma pessoa.
Os bons, os maus, os mais ou menos e os assim assim. Momentos para todos os gostos, dos quais saímos ou não ilesos, crescemos ou não, mudamos ou não.
O prazer e a dor estão intrinsecamente ligados a estes momentos. Consciente ou inconsciente procuramos repetir os momentos de prazer, consciente ou inconscientemente tentamos não repetir os que provocam dor.

Mas as memórias da dor afundam-se fundo, moldam-se e com elas a nossa percepção sobre o momento – para atenuar a dor – molda-se a memória para o que nos convêm.
Na maior parte das vezes até conseguimos ultrapassar essa dor. Recusamos deixar que a dor nos transforme em algo insípido e lutamos por não entrar num desespero, numa espiral de culpas e razões.

A minha vida é feita de equações. Mais do que matemáticas e sem resultados práticos.
Equações assentes naquilo que acredito, no que penso acreditar, no que penso saber sobre mim, no que realmente sei – o que sou e o que quero.
As equações nunca são estáticas, novos sentimentos, novas percepções e novos conhecimentos, alteram as partes de uma ou mais equação.
Dizem que evoluímos com esta mutação de equações. A evolução é um processo doloroso e emocional, porque só as emoções dolorosas têm força suficiente para alterar as equações. Há momentos em que muitas dessas equações são alteradas e tudo o que julgávamos saber, tudo o que pensávamos ser correcto, ser adquirido… tudo muda.

Mas não nos precipitemos.
Tudo fica mais difícil de analisar quando a dor ainda está presente.

O passado é passado. Ponto final paragrafo.
Não adianta procurar lógica para o que não tem explicação. Há coisas que se podem explicar e outras não. São estas últimas que abalam as nossas equações. Por vezes trata-se de um caso isolado, outras, são equações sucessivas. E toda a nossa vida fica desfigurada. Já não existe ordem, já não existe controlo e raios se existe futuro?!

Que futuro se avizinha quando aquilo que sustenta as nossas crenças, os nossos ideais, os nossos comportamentos e sonhos é fortemente abalado pela dúvida?

Creio que foram 3 as vezes em que realmente sofri por amor. Houve outros relacionamentos, pseudo relações que chegaram ao fim. Nem interessa se fui eu que terminei ou não.

Eu sou complicada. Vão poder comprovar isso. Nem vão precisar de muito tempo.

Da primeira vez que sofri por amor eu consegui sair do desespero e da dor, diria, a rastejar. Não sei bem quanto tempo depois, mas consegui recompor-me. Concentrei-me no meu trabalho e segui em frente.
Da segunda vez, a dor foi tanta que durante 3 dias não conseguia respirar como deve de ser. Acordava de manhã, sobressaltada para uma tristeza que nos esmurra o estômago, que nos preenche com raiva, revolta, dúvidas e um sem número de porquês e lógicas sem lógica. Mas lá fazemos o que temos a fazer e dia a dia consegui sair do desespero. Concentrei-me nos meus estudos fotográficos e segui em frente.
E a terceira vez?
Right…

Existem duas coisas que é seguro afirmar:
Não podemos passar pela vida sem que as coisas nos afectem.
O grau de dor é proporcional ao grau de entrega.

Recentemente, uma das minhas séries preferidas – A anatomia de Grey – falava de como num estado clínico de absoluto choque o coração deixava de bater e instintivamente o ser humano faz uma destas duas coisas: ou foge ou luta e que fique compreendido que se fugimos morremos e se lutamos vivemos. Não se sabe bem como depois disso, mas vivemos.

Lutar não é, necessariamente, andar por aí com espadas e malabarismos de diversão.
Lutar às vezes também é o recusar-me a integrar o grupo dos desiludidos, não me deixar ir, não me entregar ao desespero. Chorar certo, enquanto for tempo de chorar. Mas seguir em frente.

E mais uma vez segui em frente. Dia a dia.
Sem ressentimentos, aceitar os meus erros e perdoar os erros dela.

Em nós há duas verdades.
Aquilo que julgamos ser e aquilo que os outros julgam que nós somos.
Claro que me importo sobre o que julgam de mim. Sou uma fotógrafa profissional, trabalho como freelancer no mundo da música internacional e tenho uma ambição artística! - Mas não falo nesse julgar –

Há coisas que são mesmo minhas. Que não posso alterar, das quais não consigo fugir, as quais não posso alterar. Porque sou eu.
Depois há aqueles aspectos da nossa personalidade que se vão moldando conforme aquilo em que acreditamos, conforme as respostas das equações que vamos construindo.
Equações…

Foi isso que aconteceu da terceira vez que sofri por amor, muitas das minhas equações transformaram-se. Mais do que física, esta dor abalou toda a minha infra-estrutura.
Não era só uma questão de me levantar e seguir. Eu levanto-me, sim, mas … para quê exactamente? Ou para o quê, concretamente?

Luto, levanto-me e sigo. Sim. Eu percebo.
Mas sigo para onde e porquê?

Sigo para uma vida empenhada no meu trabalho, nas minhas irmãs, nos meus sobrinhos, arranjar um projecto qualquer e dedicar-me de corpo e alma, até que esse mesmo projecto me preencha ao ponto de consumir toda a minha atenção.

No passado ficam os bons momentos e esquecemos palavras, actos, frases inteiras que se esvoaçaram num momento de fim, sem luta.
Ter a tranquilidade para compreender e ver as coisas de forma diferente. Perceber e perdoar. Right … again … Perceber eu ainda percebo. Há muitas coisas que são agora bem mais claras, ou diria, bem mais escuras e é nesta semi escuridão que consigo sentir o que me diziam, o que queriam que eu entendesse. Pois eu percebo agora.

Perdoar?
- Tricky bit ahead –

Thursday, August 03, 2006

Front Cover

Tela de Helena Vasconcelos

Obrigada por me deixares mostrar este teu trabalho e usa-lo como a imagem de Druiel.
Obrigada pela amizade.